Tuesday, February 02, 2016

"Raízes: o livro de minhas vida" Margareth Rafael

"Então, a árvore começou a se erguer em minha mente, começando a mostrar suas flores, terminando todo o arranjo com uma variedade incrível de frutos. Aqui está o meu fruto, a minha contribuição para essa história familiar..."

 Autobiografia de Margareth Rafael.

“A criança que existia em mim ainda brincava, à tardinha, com muitos amigos. Sentávamos na calçada que havia em frente a minha casa, muitos meninos e meninas. Brincávamos de roda, de passar anel, de "Anjo bom e Anjo mau", de "Pêra, uva ou maçã", de piques, pular corda, amarelinha etc. (...) Minha vida era assim àquela época: estudar, estudar e também já estava sendo treinada para aprender a arrumar, lavar, cozinhar, passar, olhar meus irmãos mais novos. (...) Eu era bem magrinha, braços finos, pele morena clara, olhos castanhos claros, cabelos pretos grandes. Agradeço a Deus pela minha vida, tudo que ele fez em mim e por mim.

As brincadeiras que eu aprendi foram as mais lindas e criativas que eu conheci até hoje. Quando observo as brincadeiras das crianças e pré-adolescentes de hoje, percebo que valeu a pena eu ter sido criança aqui em Itambacuri. Os jogos infantis eram lindos e variadas na escola. Em nossa casa, quase todas as noites, quando juntavam todas as crianças da vizinhança para brincarem, o lugar preferido era a calçada em frente a nossa casa. Casos reais como o que relatei, brincadeiras preferidas como essas já não existem nos dias de hoje. Eram brincadeiras em que não havia maldades. Tudo que se brincava, participava e fazia era sadio.

Ser criança é poder brincar com liberdade, com alegria, sentir a brincadeira em nosso ser, ter o sabor da liberdade no coração e na alma, sentir a inocência de brincar...”


Para o leitor, próximo ou distante, amigo, familiar, ou desconhecido, que as lembranças tricotadas neste livro, como em uma toalha na mesa de uma família mineira, se convertam em escolhas transformadoras da mente e condutoras de ações humanas, antes que tenhamos que nos flagelar a dizer: "Por que não agi enquanto havia tempo?"; "Por que tomei a decisão errada?"; "Por que...?" e antes que o resultado de nossos anelos mais íntimos não passe apenas de intenções presas no passado.

Antes de mais nada, recorde e seja grato!


Minha Resenha:

RAÍZES, Margareth Rafael 
RESENHA por Messias Junior

Reconheço que esboçar minha avaliação sobre "Raízes" é, ao mesmo tempo, um desafio, pois trata-se de um trabalho muito delicado e um aprazimento, pois eu fui o primeiro leitor deste trabalho que me apresentou fragmentos desconhecidos da história de meus familiares e de seus amigos.

O título do livro é desvendado quando a autora adentra suas lembranças da infância, como uma valiosa bagagem de vivência enraizada em sua mente por anos. As recordações na obra se reduzem ao ponto de vista de uma única folha que reconhece o valor de duradouras raízes, no papel de mantê-la saudável e unida às demais folhas da copa da árvore, entrelaçadas em galhos que desabrocham de um tronco majestoso. As raízes de uma árvore são responsáveis por ancorá-la ao solo, mantê-la ereta e estável, além de absorver água e nutrientes vitais para sua sobrevivência, crescimento, desenvolvimento e restauração de mazelas causadas aos membros expostos a intempéries.

A arte de capa apresenta fundo em tons gélidos de azul claro acinzentado que remetem a cenários nostálgicos, contrapostos com os tons de castanha bronzeado, reminiscente da terra original, dessa imagem de uma árvore imponente, cujas folhas estão dispostas em órbitas em torno de um tronco sobre raízes graciosas.

Ao fundo, nota-se a imagem de um semblante masculino, o tronco de identidade altaneira, avô da autora. Clemente Moreira de Assis foi sua inspiração para ordenar lembranças e iniciar este trabalho. A contracapa propõe um mosaico de fotos do acervo da autora que ilustram sua infância, juventude e vida adulta.

Esta é a primeira edição desta obra dedicada a parentes queridos que já faleceram e outros que, hoje, tem a oportunidade de se adentrar no universo das memórias da "Poetisa da alma branca". Não faltaram os agradecimentos àqueles que contribuíram com dados riquíssimos sobre o cotidiano de cada uma das pessoas citadas na obra, em cidades interioranas mineiras como Medina, Itambacuri, Teófilo Otoni e vizinhança.

Com a leitura minuciosa e agradável desta autobiografia em 47 capítulos, nota-se, sem qualquer sombra de dúvidas, como o trabalho desenvolvido ao longo dos últimos 4 anos foi regado com muita dedicação e amor, muito respeito, atenção, carinho, saudade, nostalgia, lágrimas, sorrisos, risadas, entre outros sentimentos.

É interessante perceber como a árvore da família foi descrita já nas primeiras páginas do livro. São informações relevantes que sustentam as narrações dos capítulos por vir. Histórias nostálgicas de parentes de ambas as famílias, descrições muito bem detalhadas dos cenários que foram pano de fundo de cada evento. Apesar do tom grave de alguns acontecimentos, tudo contribui para se compreender a simplicidade com que as famílias do interior viviam, entre elementos bucólicos e trabalhos típicos das grandes casas e fazendas mineiras de outrora, cheias de pessoas vívidas, peculiares em seus modos. A cada mudança de curso, novas experiências passam a fazer parte desse percurso traçado.

O autor de "O príncipe e o mendigo", Mark Twain, destacou que atos e palavras de alguém são apenas parte de sua vida, pois sua verdadeira história se dá em seu pensamento - Ninguém conhece essa história, de fato, senão ela mesma. Ele acredita que biografias relatam (superficialmente) fatos da vida de um ser humano, mas o verdadeiro livro da vida de alguém não pode ser escrito.

"Raízes" é um esforço honesto por parte da autora de expor seus pensamentos e narrar a história de alguém que, em meio a altos e baixos, se reencontrou no caminho e continua a esboçar novas páginas deste livro.